quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Relógios geológicos



Tal como todos os relógios radioactivos utilizados pelos geólogos, o de potássio/árgon funciona apenas com as chamadas rochas ígneas. Assim designadas pela palavra latina para fogo, as rochas ígneas for­mam-se a partir de rocha fundida - magma subterrâneo no caso do granito, lava dos vulcões no caso do basalto.

Quando a rocha fundida soli­difica para formar granito ou basalto, fá-lo sob a forma de cristais. Nor­malmente, estes não são cristais grandes e transparentes como os do quartzo, mas demasiado pequenos para se parecerem com cristais a olho nu.

Os cristais são de vários tipos, e alguns deles, como as micas, con­têm átomos de potássio. Entre estes encontram-se átomos do isótopo radioactivo potássio 40. Quando um cristal se forma, no instante em que a rocha fundida solidifica, existe potássio 40 mas não há árgon. O reló­gio é «calibrado» no sentido em que não há átomos de árgon no cristal.


À medida que os milhões de anos passam, o potássio 40 decai lenta­mente e, um a um, os átomos de árgon 40 substituem os de potássio 40 no cristal. A quantidade de árgon 40 acumulada é uma medida do tempo decorrido desde a formação da rocha. Porém, pela razão que aca­bei de expor, esta quantidade é significativa apenas se for expressa como o rácio de potássio 40 e árgon 40. Quando o relógio foi calibrado, o rácio era 100 por cento a favor do potássio 40.


Decorridos 1,26 mil milhões de anos, o rácio será 50-50. Ao fim de mais 1,26 mil milhões de anos, metade do potássio 40 remanescente terá sido convertido em árgon 40, e assim por diante. As proporções intermédias equivalem a momentos intermédios desde que o relógio de cristal foi calibrado. Por isso, os geó­logos, através da medição do rácio entre potássio 40 e árgon 40 num fragmento de rocha ígnea, podem dizer-lhes há quanto tempo a rocha se cristalizou a partir do material fundido.

As rochas ígneas costumam conter muitos isótopos radioactivos diferentes, e não apenas potássio 40. A solidificação das rochas ígneas dá-se bruscamente, o que tem uma consequência feliz: todos os relógios de um dado fragmento de rocha são calibrados em simultâneo.
Apenas as rochas ígneas proporcionam bons relógios radioactivos, mas quase nunca encontramos fósseis em rocha ígnea.
Os fósseis for­mam-se em rochas sedimentares como calcário ou arenito, que não são lava solidificada mas sim camadas de lama, silte ou areia, gradualmente depositadas no leito de um oceano, lago ou estuário. A areia ou lama fica compactada ao longo dos tempos e endurece formando rocha. Os cadáveres aprisionados na lama têm grandes probabilidades de fossili­zar. Mesmo que apenas uma pequena proporção de cadáveres fossilize de facto, as rochas sedimentares são as únicas que contêm fósseis dig­nos de menção.
Infelizmente, as rochas sedimentares não podem ser datadas me­diante a radioactividade. É provável que as partículas individuais de silte ou areia que irão constituir as rochas sedimentares contenham potássio 40 e outros isótopos radioactivos, e portanto pode dizer-se que contêm relógios radioactivos; porém, estes relógios não nos servem porque não estão calibrados correctamente, ou estão-no em momentos diferentes uns dos outros. As partículas de areia compactadas para formar arenito podem ter resultado da pulverização de rochas ígneas, mas estas solidi­ficaram em momentos diferentes.
Cada um dos grãos de areia tem um relógio calibrado por uma data distinta, a qual remonta provavelmente a muito antes de a rocha sedimentar se formar e amortalhar o fóssil que tentamos datar. Assim, em matéria de cronometragem, a rocha sedimen­tar é uma confusão. Não serve. O melhor que podemos fazer - e é um «melhor» muito bom - é utilizar as datas das rochas ígneas que se encontram perto de rocha sedimentar, ou incrustadas nela.
Fonte : Richard Dawkins - "O espectáculo da vida".
 

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